Em tempos de fast fashion e descarte acelerado, um segmento silencioso e resiliente volta ao centro da roda econômica: o dos ajustes de roupa.
Enquanto a moda se reinventa a cada estação, um setor permanece quase imutável — discreto, porém essencial. Em meio à ascensão do consumo consciente e à busca por alternativas mais sustentáveis, os serviços de costura e reparos de roupas emergem como protagonistas silenciosos de uma transformação que vem do guarda-roupa, mas ecoa no comportamento do consumidor.
Segundo uma pesquisa recente do Think With Google, 85% dos brasileiros afirmam estar tentando consumir de maneira mais consciente. A ideia de “comprar menos e melhor” cresce especialmente entre os mais jovens, que veem na durabilidade das peças uma forma de expressão, economia e responsabilidade ambiental. E é nesse cenário que um setor historicamente invisibilizado ganha nova força: o de ajustes de roupas.
Silencioso, muitas vezes informal e quase sempre subestimado, o mercado de costura lida com uma demanda que resiste ao tempo e aos modismos: a roupa precisa servir — seja ela nova, antiga ou de brechó. E, diante da desaceleração do consumo no varejo e da popularização da moda circular, o que antes era visto como reparo vira escolha consciente.
“Hoje, o consumidor olha para o próprio guarda-roupa com mais atenção. Uma peça esquecida pode ganhar vida nova com um bom ajuste. E isso não é apenas sobre economia — é sobre estilo, identidade e responsabilidade”, afirma Evandro de Macedo, CEO da Tem Jeito, rede de costura e customização com origem na Paraíba e mais de 60 mil atendimentos realizados. A marca tem se destacado por unir tecnologia, agilidade e um novo olhar para a experiência do cliente — sem perder a essência de um serviço tradicional.
Mais do que empreendedorismo, a Tem Jeito representa também um movimento de valorização. Em um setor marcado pela informalidade e pela predominância feminina, a rede busca profissionalizar e dar visibilidade ao trabalho de costureiras, muitas vezes marginalizado, embora vital à cadeia da moda.
Dados de um levantamento da Usina de Dados SEBRAE PB, de 2025, revelam que os consumidores brasileiros estão cada vez mais inclinados a escolher roupas que priorizam versatilidade, durabilidade e múltiplos usos, alinhando estilo e funcionalidade. Em paralelo, os relatórios do Enjoei apontam que 56% da população já comprou ou vendeu produtos de segunda mão, e estima-se que esses itens representarão 20% do guarda-roupa dos consumidores brasileiros.
Nesse novo cenário de consumo — onde a sustentabilidade, o slow fashion e o reaproveitamento ganham força — a prática de ajustes e consertos de roupas permanece fundamental. Mesmo com menos roupas entrando no armário, a necessidade de costura não desaparece: ela se intensifica, especialmente quando a lógica do chamado “armário inteligente” estimula os consumidores a investir em peças de qualidade, valorizando a vida útil e a adaptação das roupas ao corpo e ao estilo de cada um.
Em tempos de cortes no orçamento e cautela nas compras, costurar pode ser mais viável do que comprar. Além disso, a explosão de compras em marketplaces internacionais, com padrões de tamanho diferentes dos brasileiros, também impulsiona o setor de reparos, gerando uma demanda contínua e real.
A costura — por muito tempo vista como ofício doméstico ou “quebra-galho” — agora se reposiciona como um serviço estratégico, com potencial de escalar, gerar renda e empreender com impacto social. Especialmente para mulheres chefes de família, migrantes ou profissionais com décadas de experiência que encontram no setor uma forma de sustento e autonomia.
Mais do que remendar tecidos, a costura começa a remendar distâncias entre o consumo e a consciência. Em um mundo que começa a repensar excessos, ajustar uma roupa é também ajustar prioridades.
Nem toda inovação precisa ser futurista. Às vezes, ela está em ressignificar o que já existe, dando valor ao invisível. E é nesse gesto de cuidado, inteligência e pertencimento que o setor de costura prova sua maior qualidade: a resiliência.